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Mulheres Negras Têm Lugar à Mesa? Como Normalizar o Ser Servida e Ter Espaço

Compartilho aqui com vocês, para que cada vez mais mulheres possam ocupar seu lugar à mesa — com voz, presença e dignidade.


Quantas vezes você já se sentiu culpada por descansar, por ser cuidada ou por ocupar um espaço de destaque?

Essa culpa, que tantas de nós carregamos em silêncio, não nasceu do nada — ela é histórica, estrutural e emocional. Ela vem de séculos em que a mulher negra foi ensinada a existir apenas como base, como força, como suporte — mas nunca como centro.


A mesa sempre foi o lugar das decisões, da comunhão, do poder. É onde o pão é repartido, onde o diálogo acontece, onde as vozes constroem caminhos. Mas, historicamente, a mulher negra esteve à margem dessa mesa: servindo, limpando, sustentando, mas raramente sentando-se para ser ouvida.

Foi ela quem cozinhou o alimento, mas não foi convidada para comer.

Foi ela quem cuidou dos filhos dos outros, mas muitas vezes não teve tempo de cuidar dos próprios.

Foi ela quem carregou o peso, mas quase nunca recebeu o crédito.


Durante séculos, a sociedade colonial e patriarcal nos ensinou que nosso lugar era ao redor da mesa — nunca sobre ela.

E o mais cruel é que esse ensinamento atravessou gerações, transformando-se em um eco interno que ainda hoje sussurra: “não sou boa o bastante”, “ainda não estou pronta”, “não mereço estar aqui”.

Essa voz é o reflexo da história tentando nos calar.


Mas estamos em um novo tempo.

Tempo de reposicionamento.

E isso assusta — porque aprender a “ser servida” é um ato de reeducação emocional e espiritual.

Ser servida, aqui, não é sobre vaidade ou superioridade. É sobre reconhecimento. É sobre equilibrar o dar e o receber. É sobre lembrar que quem sempre serviu também tem direito ao descanso, ao cuidado e à honra.


Estar à mesa não é apenas sobre um lugar físico — é sobre ter voz, decidir, ser respeitada. É sobre transformar o cardápio, trazer novos temperos, e convidar outras mulheres a se sentarem também. Porque não basta estar à mesa — é preciso reconfigurar o que se serve nela.


E aqui cabe uma reflexão profunda:

Quantas mesas ainda são formadas sem mulheres negras?

Quantas decisões sobre nós são tomadas sem a nossa presença?

Quantas vezes acreditamos que precisamos provar o tempo todo que merecemos o lugar que já é nosso por direito?


A mulher negra sempre esteve no coração do trabalho, mas fora do espaço de decisão. E é justamente por isso que ocupar a mesa hoje é um ato político, espiritual e revolucionário.

Quando uma mulher negra se senta à mesa, ela não senta sozinha — ela traz consigo todas as que vieram antes, todas as que ainda virão, e todas as que estão olhando, esperando por referência.


Mas estar à mesa também exige preparo emocional.

Exige curar a culpa de receber, a vergonha de descansar, o medo de ser vista.

Porque quando fomos ensinadas a servir, ser servida parece desconfortável.

Aprendemos que o valor está em fazer, em dar, em suportar — e não em receber amor, cuidado, ou reconhecimento.

Por isso, o processo de normalizar o “ser servida” é também o processo de resgatar nossa humanidade.


E como fazer isso na prática?

Primeiro, reconhecendo o próprio valor. Saber o quanto custa o que você entrega, e não aceitar menos do que isso.

Depois, aceitando ajuda sem culpa — entendendo que cuidado é um ato político, que descansar é resistência, e que ser cuidada é um direito.

O terceiro passo é escolher as mesas certas — aquelas onde sua voz é escutada, não apenas tolerada.

E, se essas mesas ainda não existem, crie as suas: através do empreendedorismo, da educação, da liderança, das redes de apoio e da fé.

Por fim, abra espaço para outras mulheres negras, intencionalmente. Convide-as, indique-as, celebre-as.

Hoje, eu te desafio a escolher uma mesa onde você não precise pedir licença para existir.

E, se essa mesa ainda não existe — construa a sua.


Porque quando uma mulher negra se senta à mesa, toda uma geração se levanta com ela.


Profª Ellen Cristina

Outubro/2025

 
 
 

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1 comentário


Que palavra poderosa!

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